Laços e Enlaces
Possui graduação em Psicologia (UNISINOS), mestrado em Psicologia Clínica (PUC/RS), e doutorado em Educação (UFRGS). Professora Adjunta e pesquisadora na Faculdade de Educação da UFRGS, área da Psicologia da Educação. Coordenadora do curso de especialização em Orientação Educacional na modalidade a distância na UFRGS.
Este período de pandemia nos lançou em uma nova história e vem nos exigindo a (re)invenção de todas as relações, tanto de trabalho, de aprendizagens, de família, de afetos. Esse movimento de (re)invenção é somente um dos pontos que nos desafiam neste momento, pois há várias outras implicações sobre os nossos cotidianos, como questão econômicas, saúde (física e psíquica), mobilidade, etc.
Pensando como professora, recorro a Jean Piaget que irá colocar que a inteligência do ser humano é justamente a sua capacidade de se adaptar ao meio ambiente. Então, é hora de usarmos a nossa capacidade cognitiva para superarmos este momento, da melhor maneira possível.
Ao pensarmos nos nossos laços hoje, podemos refletir sobre como estão estabelecidos, como estamos ou não conseguindo mantê-los e quais as condições que temos para que estes laços continuem enlaçados?
Manter as relações em todos os âmbitos tem sido um esforço para que não fiquemos isolados e possamos estar “perto” dos nossos afetos. Mas, nem para todos isso está sendo possível, como por exemplo, as escolas. Como as escolas estão se organizando para manterem os laços com as suas comunidades?
A partir de relatos de diversos profissionais da educação, nos solidarizamos com todo o trabalho que estes estão realizando para alcançar seus estudantes. A criatividade de suas atitudes, atividades para conseguirem manter a relação com os alunos e, além disto, as aprendizagens, é admirável. Considerando-se que muito pouco as tecnologias fizeram parte das suas formações, que muitos alunos não têm acesso a elas, como as escolas estão conseguindo estes enlaces?
Piaget também referia que a aprendizagem não ocorre somente no nível cognitivo, que ela não prescinde do afetivo, e os educadores sabem disto, a escola sabe disto. Então, a manutenção desses vínculos se torna mais importante ainda, pois além disto, a escola é um ponto de referência para muitas famílias e comunidades, exercendo um papel importante e, hoje, inclusive vital, tanto nos auxílios com alimentos, remédios, quanto na questão informativa sobre o que vivemos. Em um mundo no qual as fake news tomaram conta das redes, confundindo as pessoas sobre o que é verdadeiro ou o que é falso, a escola pode (e deve) cumprir o papel de auxiliar no discernimento das informações, bem como, na divulgação e orientações corretas para a comunidade.
As escolas, aqui no sul, que até agora estavam impedidas de utilizar celulares nas salas de aula, passam a ser estimuladas a conectarem-se e fomentarem o uso por parte dos alunos. O que até então era abominado nos espaços escolares, passa hoje a ser visto como a salvação. Na tentativa de manutenção de seu fazer, as escolas passam a se utilizar das tecnologias para transmitirem os seus conteúdos.
Mas, será que as escolas se resumem a isto, ou ainda, será que neste período de exceção que vivemos os conteúdos escolares são o mais importante? Refletindo sobre esse ponto, as aprendizagens são extremamente importantes, mas, eu diria que muito mais importantes do que as aprendizagens conteudistas são as aprendizagens afetivas (os laços e enlaces), pois são essas que irão permitir ou possibilitar o desenvolvimento cognitivo. Ou, será que há como nossos estudantes aprenderem sem saúde psíquica?
As tecnologias surgem como possibilidades para efetivarmos várias atividades, que vão desde as compras de supermercado, de farmácia, consultas médicas online, aulas a distância, ligações familiares, reuniões de amigos, entre várias outras. Os seus usos, quase ilimitados, nos permitem planejamentos diversos para aquilo que desejamos. Então, questiono quais as aprendizagens que as escolas estão construindo com os seus alunos, e como?
O destaque aos conteúdos é o que sempre é cobrado das escolas, de ter que vencê-los, os objetivos, as avaliações, entre outros compromissos que ultrapassam muitas vezes, o aspecto humano. A valorização do produto “saber” vendido é o que a escola precisa ofertar e cumprir, é a sua obrigação. Será que, realmente, isso é o mais importante para nossos alunos? Será que esquecemos de outro papel da escola, fundamental para nossos alunos, da escola enquanto um espaço de convivência com os pares, com professores e integrantes da instituição. Esse espaço para eles tem diversos significados: a interação, as trocas, as conversas e o desenvolvimento psíquico. Além disso, a escola, para muitos, pode ser o único lugar seguro, tanto como provedor de alimentos quanto como protetor contra violências.
A prioridade não pode ser com o produto “saber” que a escola oferta, mas sim, deve ser com o processo vivenciado para chegar ao “saber” – ou saberes -, pois há tantos em jogo que os alunos precisam aprender para conseguirem superar este tempo de exceção. Eles precisam saber o que está acontecendo, como lidar com isto; como diferenciar fakes, como realizar uma crítica às informações com que são bombardeados; precisam desenvolver a empatia, tanto com seus familiares, como com os seus colegas; compreender a noção de cidadania e a sua responsabilidade.
Assim, que o uso dos celulares (e outras tecnologias) hoje liberados tenham um caminho promissor na construção de novas aprendizagens, tanto cognitivas, como afetivas e que sirvam como pontes, frutíferas para criar laços e enlaces.
E, para finalizar, um pouco de música que sempre alegra a alma e nos faz esperançar que “Nada será como antes…”
Abraço carinhoso e cuidem-se!
Profa. Silvana Corbellini
*Fonte Imagem: https://2.bp.blogspot.com/-J3NreCLfF9U/UF5jrT7WkwI/AAAAAAAABfo/GEnf4E-CW0c/s1600/atados.jpg
Perfeita colocação!!! Estamos nos recriando como pais educadores e precisamos saber aproveitar esse período de forma agradável para ambas as partes.